Shion de Áries (Ricardo) x Kanon de Gêmeos (Aoshi)

- Obrigado...

Um malfazejo, assim sentia-se o homem com o passado mais nobre dentre os cavaleiros. No entanto faltava-lhe algo natural em seu próprio eu, a honra, apenas a honra. Essa havia sido usurpada, escachada de seu peito. Seus passos carregavam a destreza de um mestre – o passado lhe fez doutrinador em suas atitudes. De um lado e de outro o escuro brindava com sua arrogância, a presença de Hades nunca foi tão intensa. O Santuário aproximava-se ao tempo que os ventos cerceavam o silêncio, roncando o clamor das almas infernais. Hades fazia-se presente em tudo, infestando os objetos inanimados e até mesmo a sanidade de quem ali adentrara. Mesmo a experiência deste mestre – lapidada nas mais ferrenhas batalhas – não lhe permitia entender a essência daqueles cosmos. Seus atos eram banhados sob a tutela do indulto de Athena, dignando a sapiência, mesmo quando a lide é cometer o impensado. Era impossível esquecer o passado, a “entrada” se aproxima, sacolejando seu coração.

- É exatamente onde deve ficar Mu, ajoelhado e paralisado, estes dois cuidarão de você, enquanto isso tenho de seguir em frente. Espero que possamos nos encontrar de novo...Mu...

Sem cessar sua investida, o ariano conduzia palavras ao vento. Ao lado de um laço afetivo, criou um admirável respeito pelo que defende a primeira casa. Um pupilo? Não... Muito mais. Lutar contra ele seria uma satisfação pessoal, mas a celeridade à que seus planos sucumbiam, não lhe deixava tempo para o “prazer’. Sob sua face deitou um manto, escuro como o negrume da noite grega. Estaria se escondendo a título de vergonha? Talvez... mas a satisfação em estar ali era óbvia. Vez ou outra nascia um sorriso no canto de sua boca. As casas passavam como fantasmas...fantasmas de um passado não muito distante, havia finalmente deixado touro, lá os “outros” cuidariam do dourado, não tinha tempo a perder, a próxima casa era avistada ao longe, conseguiria passar com facilidade afinal...Não...Como um lapso ele surpreende-se ao enxergar que há uma presença naquele local que deveria estar inabitado, talvez um dos dourados tivesse descido e antecipado sua morte, seja quem fosse, estaria perdido.

- Revele-se cavaleiro, eu sei que você está aí!

Assentou os olhos sobre a silhueta que se movia. Ouviu-lhes o crescente eco dos passos até que a distância lhe fez enxergar o absurdo. Restituído o silêncio das vozes e dos gestos humanos, restava a eloqüência dos ruídos noturnos, o trançado dos sons insignificantes e agourentos que os vates diriam confessar as posições de vitória e derrota. O invasor contemplou-lhe a postura sólida. Patifaria. Os comedimentos e a aristocrática displicência do cavaleiro o engrandeceriam se não existisse uma nota de desaire nas vestes douradas que escolhera – elas estilhaçavam-lhe a coerência e a soberba. Não deveria ter realmente se restituído de todo o mal, aqueles que nascem com aquele tipo de alma como aquele homem estão destinados a carregar o fardo da maldade eternamente, mesmo que teimem contra o seu próprio destino. [dohtml]

- Tsc, eu é que fico admirado em encontrá-lo aqui. Deveria estar morto, nem merece estar aqui, vejo que Athena lhe concedeu o perdão, é digno da fraqueza de Athena. Você será meu adversário? Hu..hu..hu Só pode estar brincando, ou perdeu totalmente a sanidade, estas vestes não lhe tornam diferente do que você foi no passado e não importa o que faça, nada será capaz de mudar isso, carregará o mesmo fardo que eu...Kanon de Gêmeos...

Finalmente retirava o manto que lhe cobria o corpo revelando a armadura com cheiro de morte que cobria seu corpo, era negra, sem brilho, porém uma proteção além da imaginação de seu inimigo, tão ou quase tão poderosa quanto a dourada, deu mais alguns passos a frente para encarar ainda mais seu inimigo. O invasor impregnava o ambiente com sua presença cósmica, que se insinuava por todos os pontos, enroscando-se nas várias colunas de sustentação da morada, e no próprio cavaleiro defensor da mesma. Entretanto, não eram perceptíveis sinais de hostilidade em sua energia, que placidamente repousava sua monumentalidade no local. Lapidava frases galhofeiras, mordiscando o ego do homem a sua frente. [dohtml]

- Esta é a armadura do mundo dos mortos, súrplice, mas sinto que poderia acabar com essa sua farsa sem trajá-la, você não é o cavaleiro de gêmeos e não pode fazer frente a alguém como eu, como pode ver não sou o mesmo que fora morto por seu irmão, Hades me concedeu a jovialidade de 243 anos atrás, mesmo que tente, não é páreo para o poder do grande mestre, saia da minha frente ou farei com que a casa de gêmeos seja o seu túmulo.

Finalmente mostrou hostilidade em sua energia que se elevava, o tempo era seu maior inimigo na verdade e tinha de ser rápido. Orgulhava-se por alguém como aquele homem ter encontrado a salvação de sua alma e aquele combate que estava prestes a se iniciar certamente seria a libertação de toda a sua angústia e culpa. Por outro lado se quisesse manter o disfarce ele teria de ser convincente e assim sendo matar aqueles que estivessem em seu caminho, o pior dos fardos, seu nome seria manchado por toda a eternidade, mas tinha de ser feito e ele era o único que poderia. O Grande mestre, aquele que possuía a informação que faz com que Athena tenha chances reais diante de Hades, não poderia perder tal oportunidade. O cosmo explodiu liberando todo seu poder, fechou os olhos...O combate finalmente se iniciaria.

- Está pronto Kanon?

A noite estava encontrando o seu final. A madrugada já invadia-a sem ao menos pedir licença enquanto que, na terceira morada um clima tenso se instalava. De um lado o homem, de adjetivos ilustres e portando um semblante dos mais confiantes. À frente do “falso” defensor da terceira casa estava o mais honorífico dos cavaleiros – não por sua força, mas por seu caráter. Pouco se sabia sobre aquele homem, mas ninguém duvidava que o título de Mestre lhe servia como uma mostra de sua confiança em campo, uma miscelânea de terror e paz ali se instalavam. [dohtml]

- Um belo espetáculo, Kanon, realmente impressionante, pelo visto os boatos são verdadeiros e você detém o mesmo poder de seu irmão....Muito poder, no entanto, muito amadorismo...

As ameaças, agora veementes e incisivas, soaram como uma écloga burocracia ante batalha. Suas pálpebras piscaram, retornando num brilho ascendente. O que motiva tanta confiança? Talvez o período vivido no submundo, rogou-lhe uma insanidade descomunal; afinal desafiara, com tanto desprezo, aquele intitulado dos mais fortes. Um mórbido devaneio? Não para aquele homem e seu cosmo agora espalhava-se brandamente no encalce dos pontos cegos das ilusões, o poder faiscava ao seu redor enquanto ele ascendia ao infinito para acabar com toda aquela palhaçada, o poder psyquico do mestre parecia estar impregnado em seu próprio cosmo e se espalhava por toda a mansão percorrendo cada ponto para desativar a tentativa fracassada de Kanon em tentar ludibriar alguém como Shion em meio a ilusões, por fim toda a encenação havia sido destruída revelando o verdadeiro dourado a sua frente que controlava toda a situação com maestria.

- Já chega Kanon, não tenho tempo para brincar de gato e rato com você, tenho de levar a cabeça de Athena para o Imperador Hades...Prepare-se para receber a punição por ousar manipular os deuses!

Finalmente o mestre mostrava sua energia para todo o santuário, todo o poder oculto por centenas de anos agora deixava a morada de gêmeos pequena para tamanha expansão. Seu objetivo fora priorizado e então ele estava pronto para atacar com todas as forças, a corrente cósmica correu mais poderosa entre seus braços até a palma de ambas as mãos, energizou mais um pouco enquanto o show de luzes arroxeadas dominava a casa, jogou ambos os braços para trás....finalmente a guerra começava entre os dois, tamanha era energia que obrigaria Kanon a reagir rapidamente e usando todo seu poder e talvez sequer fosse suficiente. [dohtml]

- VAMOS VER DO QUE É CAPAZ...

- KANON DE GÊMEOS

Apalpou o sétimo sentindo enquanto toda aquela concentração de energia tornava-se um ataque poderosíssimo, mesmo para o geminiano seria impossível escapar de tamanha investida, só lhe restava medir forças com o antigo mestre que provava naquele poder que não estava ali para brincar e também tiraria qualquer dúvida que o novo santo tivesse sobre suas reais razões, era isso que queria, merecia aquele fardo. Tudo por Athena, ele tinha de derrotar um irmão salvo da maldição, tudo dependia de seu sucesso.

- E então Kanon o que acha desse poder? Mesmo se o seu cosmo se equiparar ao de Saga, mesmo assim você será subjugado pelo poder do grande mestre do santuário!

Expressava-se sem qualquer perturbação de ânimo, rebaixando os últimos acontecimentos a condição de vulgaridades. O ataque era direto e a resposta do defensor da casa era impressionante, conseguia equiparar os poderes por alguns instantes, contudo, claramente o esforço foi maior do lado de lá enquanto o Mestre ainda imponente mostrava apenas com seu olhar que o resultado daquele confronto já estava definido. Uma explosão acontecia iluminando por alguns instantes a morada de gêmeos, a cratera no centro da colisão mostrava o valor de ambos, agora o geminiano teria a sua chance, mas indiferentemente do que imaginou ele optou por outro tipo de técnica. Momentaneamente o mestre era paralisado com o seu portal, ao vislumbrar o fracasso de suas intenções, sua consciência, boquiaberta, esfalfava-se em compreender o que se passara. Uma resistência inesperada se opôs e ele era completamente sugado para outros mundos, o corpo errante era exposto a uma pressão incrível, mas para o grande mestre aquilo não definiria absolutamente nada.

- Para alguém como eu, isso não passa de brincadeira de criança...

O enrijecimento de seus músculos, seguido pela consequente paralisação na outra dimensão, perturbou-lhe o ego. Seus sentimentos de brio, porém, conservavam-se intactos. Perceber-se, ainda que momentaneamente, encurralado não lhe causava desconforto ou enraivecimento. Pelo contrário, excitava-se, povoando-se de pulsões de violência e ânsias de combate. Um exame de sensações sádicas assolava-o. Tinha de volta decidindo toda aquela situação e quando percebeu as intenções de Kanon em ganhar mais tempo fez com que ficasse ainda mais furioso, gêmeos não podia com ele sozinho e estava num método evasivo ridículo. Entre ondas de energia a silhueta ia se materializando célula por célula até completar o transporte interdimensional do mestre, percebia que o protetor estava com bastante energia acumulada, não iria mais abrir a guarda como naquela vez e também não daria chances para Kanon, tanto que sua volta foi nos vislumbre do sétimo sentido, seguido de seu maior dom, a mais poderosa das técnicas.

- JÁ CHEGA KANON!

- VOU LHE MOSTRAR TODO O MEU PODER E ACABAR DE VEZ COM ESSA PALHAÇADA...ABRA BEM OS OLHOS KANOOON!

Do céu estrelado criado pelo ariano, uma chuva de meteoros emerge na casa de gêmeos tornando-a palco de um jogo de luzes incrível. As estrelas cadentes tomam forma de feixes poderosíssimos de luz que partem na direção do geminiano na velocidade da luz, um bombardeio insaciável que impossibilitava completamente a evasão do mesmo, não havia opção de escape, a chuva destruía tudo pelo caminho, moldadas sobre uma rajada poderosíssima de energia pura, tamanho era o golpe que grande parte da morada viria abaixo e caso fosse atingido o cavaleiro dourado teria sérios problemas uma vez que aquele golpe fulminaria seu corpo sem piedade, a armadura poderia até protegê-lo, mas não o bastante para não ficar a beira da morte diante de um ataque – claro se fosse completamente atingidos pela investida – Shion mostrava que não estava para brincadeiras e lançar sua técnica máxima daquele modo lhe revelava isso.

- Não pode me parar...

O mapa astral catalogava os eventos da Guerra Santa, registrando suas consequências no desaparecimento sistemático de constelações inteiras. De um céu outrora repleto, restavam apenas lantejoulas mirradas cintilando no vácuo preto do espaço imenso. E à medida que, uma a uma, as estrelas se despedem e se apagam, os cavaleiros por elas representados mergulham resolutamente na desgraça. A abóbada celeste revelava-se em um avançado estágio de inanição: magra de estrelas, estava quase sucumbindo ao breu que se avizinhava o que significava que seu tempo era ainda mais precário, sua saída da dimensão errante não seria dificuldades, através do teletransporte ele conseguiria sair de qualquer dimensão que fosse enviado, mas um fato é bem perspicaz naquela situação e o próprio teletransporte apesar de apresentar algumas falhas também tem vantagens bem proveitosas, podendo prevenir Shion do que encontraria ao chegar, pois ele tem a pequena visão da oscilação cósmica do local e a julgar pelo modo que o geminiano espalhou energias distintas pela casa era óbvio que o antigo demônio estava tramando algo. Seria tarde demais? Ou talvez...

- Então é isso, me fez acreditar que a Outra Dimensão era sua tentativa de vitória quando preparava este ataque para que eu fosse derrubado quando voltasse à casa de gêmeos...

- NÃO TÃO FÁCIL KANON!

A materialização de seu corpo fora milimetricamente junta à criação do muro de cristal, afinal, antes de voltar de fato ele também conseguia ver o que se passava em seu rumo de viagem inter-dimensional o que lhe permitiu criar aquele muro de última hora e os primeiros impactos bombardeavam a parede, mas sequer conseguiam voltar contra seu criador tamanho era o impacto e pior, aquela variação era ainda mais peculiar pois as energias em forma de planetas vinham de todas as partes consequentemente atingindo Shion por trás e pelos lados num bombardeiro sem fim, por sorte conseguiu evitar os ataques sequenciados que vinham da frente – devido a criação do muro – por fim após ser brutalmente seu corpo fraquejava descendo o joelho direito enquanto a perna esquerda mantinha flexionada dando-lhe apoio, já era notado que algumas partes de sua armadura do mundo dos mortos estavam deterioradas, enfim elas não são feitas do oricalco como as douradas quase indestrutíveis diante humanos.

“Como pode? Este homem, esta determinação...Ele luta mesmo por Athena? Essa presença...Esse cosmo...é de que se for preciso morrerá lutando para que ninguém passe por esta morada, ele está mesmo disposto a sacrificar tudo? Seu poder realmente se iguala ao de seu irmão...Mas ele ainda é diferente...Não...Não posso esquecer dos meus objetivos...Infelizmente agora terei de usar todos os meus poderes, mas seria uma honra ver até onde esse homem iria por Athena...”

Como a desonra tinha um gosto amargo; gosto de sangue! Daquela mortalha pútrida insurgiu uma nova vida – não límpida como a de Kanon, mas recheada em vontade de vencer. Os olhos ferozes fizeram retomar seus objetivos, outorgados pela irmandade. Não há mais tempo a perder. Seu cosmo alcançava patamares inimagináveis mesmo para o cavaleiro de gêmeos, finalmente o poder do grande mestre em seu ápice depois de 243 anos, seus olhos brilhavam, não eram olhos de um cão de Hades, eram olhos de um cavaleiro de Athena, por Athena e para Athena!!!

- ...É o seu fim...Kanon de Gêmeos!

Estrelas cadentes...Mortais estrelas, o poder daquela revolução seria ainda mais devastador que a tentativa anterior, desta vez nada poderia parar a fúria das estrelas cadentes que eram disparadas como balas de uma metralhadora na direção do geminiano, cobrindo toda as suas possibilidades de esquiva, afinal, o golpe encurralava perfeitamente o seu adversário bombardeando-o numa sequência de milhões de golpes por segundo até que o adversário de Shion fosse completamente alvejado e jogado para vários metros com vários ferimentos e no caso de Kanon só estaria vivo por causa de suas vestes que salvavam sua vida mais uma vez, no entanto, a dor muscular era grande e talvez uma próxima investida de tamanha magnitude seria o suficiente para definir aquele combate que já se prolongava mais que o esperado.

- Não resista...Kanon...!

O ciclo caótico de destruição fora iniciado. Empedrado na teima e no orgulho insensato, a confusão do horrendo desenlace que outrora fora apenas um treino ingênuo, seguia o combate. Flor a flor, as violetas sem vida, os rosais sepultos, por que há de ser assim?! A rivalidade nunca cessa, e os duelos pela supremacia serão sempre ilustrados por este orgulho errôneo e maldito. Rasgando em fúria, às unhadas, o peito e contra os escombros, a imponência do mestre se fazia presente. Seu maior dom era evocado, no entanto, Kanon era muito mais do que aparentava ser, conseguindo criar uma fenda que servia de brecha para os impactos da revolução estelar, sendo assim completamente absorvido e ao mesmo tempo explodindo aquela dimensão em questão. Deveras impressionante.

- Foi capaz de evitar a Revolução Estelar criando uma abertura entre dimensões que lhe serviu como escudo, o que dá tanta motivação a você Kanon?

Ígneas e imortais, num redemoinho insano, longe, a torvelinhar nos céus inacessíveis, pairam constelações virgens do olhar humano. A harmonia das estrelas jorra ampla e sonora. Quanto aquele casarão, tão rústico, tão nobre, porém detentor de um poder descomunal, dois de seus inquilinos, ainda que por ignorância semeavam uma discórdia sem precedentes. As ardilosas presenças já haviam atingido um êxtase que seria impossível se aterem àquele refúgio arcano. Sabia que Kanon jamais desistiria, também sabia que hora ou outra ele conseguiria fazer o geminiano tombar, mas isso não deveria demorar mais e pelo jeito que se tornara a situação, o tempo seria seu maior ponto fraco lhe expondo a ações inconsistentes. Tinha de usufruir de suas habilidades para parar o cavaleiro de gêmeos, desta vez seria diferente.

- Desta vez será diferente....KANON PREPARE-SE!

- Não importa o que faça, todo esse poder será o suficiente para te conter cavaleiro de gêmeos...Não há como fugir!

Uma energia para denotar o que ele queria exatamente, não por ser uma expansão cósmica, mas por ser uma armadilha, na verdade o poder mental do mestre se espalhava entre raios e trovões por toda a morada, Kanon já não podia mais fugir da visão do grande mestre e o dourado logo sentiria seu corpo não responder mais aos seus comandos, sentia uma aura púrpura contornar todo o seu corpo, os jogos de luzes cessavam, era apenas uma distração para fazer o dourado pensar que Shion destruiria a mansão de gêmeos. Um erro pensar isso, aquele homem usa dos métodos mais frios e inteligentes num combate, Kanon se via completamente preso, a telecinese de Shion controlava seu corpo contorcendo-o enquanto fazia o mesmo aproximar-se de Shion, a pressão era tamanha que quase não dava tempo ao dourado em reagir, não apenas isso, o mestre tinha de ser definitivo.

- Telecinese, mesmo você Kanon não é páreo para o meu poder...Nada do que faça irá te libertar desta paralisação, você mostrou ser um cavaleiro honrado e realmente mudou seu jeito de ser, infelizmente agora é tarde demais...Deve morrer aqui e agora...

Embebedado com a força máxima de suas habilidades, a desvantagem tornou-se vantagem. O tempo jogava seus dados, parecia querer brincar com o distinto ariano. As ponderações que fluíam em seu monólogo interior não eram notas de pânico, apenas um criterioso exame da conjuntura que se estabelecia. Prolongar mais, seria muito perigoso, não que ele temesse continuar, mas até o momento Kanon havia se portado como um difícil adversário e agora tinha de ser neutralizado rapidamente.

- Parece que o poder da telecinése já está fazendo você delirar, acha mesmo que pode ir contra as minhas ordens e vontades Kanon? É melhor perceber agora a diferença entre nossos poderes, mas se quiser posso lhe dar uma pequena amostra antes de lhe enviar para o mundo dos mortos...

- Veja só o poder do Grande Mestre do Santuário!

A pressão era ainda pior que antes, a medição de forças era praticamente anulada quando o ariano revelou todo seu poder, o negrume voltava a dominar e com ele uma pressão sobre corpo do atheniense fora do normal, era totalmente contorcido enquanto sequer conseguia respirar, não eram apenas influências externas, o poder do lemuriano ao aplicar aquela habilidade era diverso e ao seu bel prazer ele agiria da forma necessária para derrotar seu inimigo. O ruído rouco e denso advinha do tiritar de algumas das enormes colunas da morada. Estas balouçavam até escaparem de seu eixo de sustentação e projetarem-se contra as costas do cavaleiro de ouro, não somente isso, a pressão interior impossibilitava momentaneamente algumas circulações básicas do corpo humano que se travadas por um curto espaço de tempo levam a morte instantânea, no entanto, o mestre não faria aquilo – não por pena – mas porque não era de sua índole, mesmo por trás de toda aquela farsa, não atingiria um irmão de armas daquela forma. Aos poucos Kanon recuperava toda a sua circulação normal dos órgãos outrora paralisados, a demonstração havia sido dada. Ele havia sido atingido pelas pilastras e quando menos percebesse via seu corpo agindo contra sua vontade iniciando uma espécie de flutuação. Hades estava mais presente do que nunca naquela morada e ele já havia notado, tinha de ser convincente, tinha de ser...Maligno.

“Perdoe-me Kanon...Perdoe-me Athena...”

- Comecemos pelo braço esquerdo!

E então a dor se instalaria insanamente no corpo do dourado, a dor de ter pelo menos três ossos de seu braço esquerdo quebrados, o sangue escorreria e a dor seria imensa, por fim Shion arremessara Kanon impulsionando-o numa violência sem precedentes. Ele “bateria” em todas as pilastras que se encontrassem em seu caminho destruindo-as instantaneamente e deixando um rastro de destruição até finalmente ser soterrado pelos escombros já totalmente livre da influência de Shion. O Mestre imponente de natureza caminhava no intuito de já deixar a casa de gêmeos e dirigir-se até a próxima morada, seu cosmo, no entanto, mantém-se emanando a aura púrpura incessantemente, como se previsse algo.

Inflou os pulmões e soergueu o peitoral metálico. Em concomitância, espraiou os braços. Esforçava-se por condicionar especial vulnerabilidade a seu coração, oferecendo-lhe ao possível trajeto de seu poder. A descompostura daquele ato deflagrou o curto estopim do cavaleiro de gêmeos, subjugado pelo mestre e ainda teimando contra seu destino. Aquele cenário inóspito e asséptico corresponderia, de fato, ao plano psicológico e comportamental do cavaleiro? Por mais que tentasse sublimar-se do mosaico das sentimentalidades, Kanon estava irremediavelmente atrelado a ele. Aquela patente frialdade era fecunda em entrelinhas e o ofício de Shion havia feito da leitura da alma uma prática compulsória. Conhecia-a sob todas as maquilagens e distorções, e pudera postular uma tepidez invariável no espírito dos homens.

- Ainda não desistiu Kanon? Não viu que é impossível fazer frente ao antigo mestre do santuário? Pois muito bem, se insiste tanto em morrer...Eu assim o farei...

Enunciada a última frase, um lampejo ofuscou-lhe a imagem e o cenário. Extinta esta fulgência, uma miríade de constelações evidenciava-se. Cingiam as colunas e estendiam-se em trajetos complexos, galgando os telhados e descendo aos solos, serpenteando e cruzando-se, realizando contornos e percursos mil. Muitos não se amparavam em qualquer suporte, permanecendo suspensos e estáticos no ar. Os filamentos encontravam sua proveniência na mão erguida do mestre. Consentira-lhes o dom da visibilidade por veleidade. Entretinha-se com geminiano e desejava que o mesmo assistisse como seria engenhosamente enredado.

- Tome isso...Kanon!!!

Terrível energia, grandioso poder. De suas mãos surge a destruição daquele acumulo cósmico, a velocidade da luz brindava a corrida da energia maciça, certamente atingindo seu alvo que não estava ainda totalmente recuperado da investida anterior, o que lhe restaria era apenas confrontar forças mais uma vez, restava saber se como da outra vez; Kanon conseguiria medir forças com o mestre que lançava uma energia incrível embasada de seu elevar máximo. O sétimo sentido.

Uma súbita euforia tomou conta de seu ser. Após incontáveis horas relutando em aceitar o destino que se abria diante de si, em deixar para trás a paixão que consumia seu âmago com a justiça idealizada através de Athena, em aliar-se ao inimigo de longa data da referida deusa... a decisão fora tomada como numa repentina epifania. Mas então, diante da angústia que o inundava, parou. Parou completamente. Tudo ao redor era silêncio: silêncio e o eco surdo das batidas lentas de seu próprio coração - eram como a percussão para o triste réquiem de sua própria vida.

“ Por que...Por que resiste Kanon? Esse sentimento...Por que não consigo te eliminar de uma vez? Devo atacar com tudo o que tenho agora? Maldito fardo...Não...Eu sou o único capaz...Tenho de chegar até Athena mesmo que para isso...

- Vejo que os ferimentos são tão graves que obrigaram você a se desfazer se sua armadura dourada, vejo que definitivamente você não possui o mesmo poder que seu irmão, e, abraçar a morte de maneira tão ingênua te faz ainda mais inferior, no fim das contas não é um cavaleiro de ouro e isso pesou neste momento...

O breve mergulho em suas lembranças havia o extasiado. Mesmo que por momentos, sentia o seu coração desta vez bater forte... E a certeza de que finalmente conseguia ver o mundo além de percepções. As ponderações que fluíam em sua análise interior não eram notas de impulsividade, mas sim um criterioso exame da conjuntura que se estabelecia. O trajeto de volta foi envolvido em um silêncio sepulcral que não se parecia em nada com aquela ausência de som que denota cumplicidade ou com aquela quietude confortável: era tão-somente a inexistência de maiores motivos que os levassem a conversar naquele instante. Caminhou para fora do palacete, observava a figura pronta para morrer; sem ao menos descer os poucos degraus ele parava a caminhada e mais uma vez acendia as chamas negras de seu novo cosmo. Tinha de acabar com o homem de adjetivos nobres a sua frente e lhe daria a morte que um cavaleiro de Athena realmente merece, brindando-o com seu maior dom.

- Morra Kanon!!!

Subitamente ele age ao explodir sua energia, lançando mais uma vez sua maior técnica. Do universo criado pelo ariano, centenas de estrelas cadentes banhadas ao cosmo de Shion são disparadas contra o cavaleiro de gêmeos, por todos os lados, de todas as partes, um bombardeio sem fim. Ele seria subjugado, seu corpo fuzilado, esfacelado pelo poder máximo do grande mestre, a luz de energia tomou conta da escuridão eterna que era aquela noite. Uma noite que ficaria marcada na história de todas as guerras quando o mais honroso dos cavaleiros ergueu o punho contra a sua própria deusa, tudo...tudo para que ela pudesse alcançar a vitória...Maldito fardo...maldita escolha; mas, necessária. Ele era o homem certo.

Suas ações finalmente tinham um resultado. Kanon havia sido mortalmente atingido pela revolução estelar e por estar desprotegido de uma armadura teria seu corpo completamente alvejado pela sequência incessante das estrelas cadentes provenientes do mais poderoso dom do ariano. Tudo estava acabado até que...

- Uma ilusão? Como....Kanon....

Também os círios do Relógio, com o tremeluzir funesto de suas chamas, escarneciam da empreitada dos renegados, atestando-lhes a brevidade de suas vidas com o extinguir sistemático das horas que concebiam matéria e concretude a seus espíritos irrequietos. À medida que as palavras de Kanon desenhavam raciocínios na consciência de Shion, memórias envidavam. Sua operação fora objetiva e concisa, ignorando os que não lhe importavam, fizera apenas recair um olhar incógnito e imponderável sobre o Atheniense, cujo significado era por demais enigmático. Kanon Esquadrinhava camadas virgens e insondáveis da psique de seu adversário. Esculpia as palavras com espontaneidade, professando-as sem pedantismos. E tampouco tencionava combalir seu adversário por intermédio da linguagem. Finalmente, em suas últimas palavras ele gritou o nome de sua poderosa técnica...

- Quanto poder...

A surpresa lhe rendeu uma maldição, a técnica surge perfeita, um verdadeiro massacre ao falso corpo de Shion, destruindo várias e várias partes de sua falsa armadura, a dor da explosão galática não era o pior dos seus problemas, o tempo passava e ele não conseguia seguir seu caminho. Por fim voltou à casa com vários ferimentos, mas ainda com uma certeza, jamais poderia desistir. Com dificuldades voltou a ficar de pé, um filete de sangue escorria no canto de sua boca, enquanto em seu corpo vários hematomas já deixavam sua locomoção limitada, por outro lado, Kanon também havia gastado quase toda a sua força. Agora venceria aquele que tivesse maior determinação.

“Nossa honra será para sempre manchada, para nossos irmãos seremos dignos de repugnância e mesmo assim vocês aceitam?”

- Obrigado...

Seu cosmos lançou-se em uma ascensão meteórica, desaguando na suntuosidade e na oceânica imensidão do Sétimo Sentido. O complexo novelo que infestara a Casa de Gêmeos rutilava com vivacidade, colorindo-a em tom purpúreo. Enaltecido por Athena e por seus objetivos o coração tinha de falar mais alto naquele momento, iniciou então uma corrida na direção de Kanon, mesmo seus músculos lhe negando, sua vontade falava mais alto, sua alma lutava contra a dor e ascendia um cosmo magnífico. Quando finalmente chegou a ficar mais ou menos um metro de distância do geminiano, aplicou-lhe um soco mesclado à energia cósmica que envolvia seu punho esquerdo no lado esquerdo de sua face, não apenas isso, com o punho direito aplicava outro soco na altura do peito fazendo o cavaleiro de ouro ser arremessado alguns metros. Já não tinha mais poderes para lançar suas técnicas especiais, portanto, tinha de usar qualquer método para completar sua missão.

- Não me importa nada disso...Kanon...de um jeito ou de outro eu conseguirei levar a cabeça de Athena para Hades ... Por uma nova vida serei capaz de lutar até não aguentar mais...

- Não me faça rir Kanon, por acaso está beirando a insanidade devido os ferimentos? Não haveria o porquê de eu ter medo desses espectros de poder tão inferior, eu sou o que você está vendo...Em troca de uma nova vida até mesmo eu fui capaz de me vender. Não espere que eu vá me arrepender de minhas atitudes, pois não vou, todos escolhemos um caminho a seguir e eu escolhi o meu...

Por mais amplo que fosse, aquele extraordinário ambiente de paredes geladas e amargurados ecos sussurrantes daquela morada causava-lhe um aperto no peito, infligia-lhe uma claustrofobia de intensidade gradativa e a agonia parecia desabrochar e o arrebatar com voracidade. Finalmente Shion começava a entender qual era seu devido papel naquele sinistro ditirambo. Bateu-lhe, sem mais cerimônias, a súbita compreensão de que sua existência naquele momento era apenas o mal apreciado Corifeu, que fazia a ponte dialética entre o ator e a platéia. Entre todo aquele teatro ainda havia uma alma justa, o mesmo espírito de luta de antes quando lutou bravamente ao lado de seus irmãos. Suas atitudes e caminhos cabiam apenas a ele e provavelmente para ele aquele era o certo a ser feito, afinal, apenas ele conseguiria fazer o que tinha que fazer, era o seu fardo a mais de 243 anos, desde que tornou-se o mestre do santuário.

Observou Kanon assumindo posição de combate, entendia que aquilo era a resposta que precisava, morrer ali seria como perder a guerra contra Hades e mesmo que precisasse passar por cima de todos os cavaleiros ele assim o faria, sua determinação renovava todas as suas forças perdidas no ato anterior, todos os ataques e hematomas pareciam não mais importar, ele não agonizava ou lamentava pelos ferimentos, pelo contrário, quando finalmente assumiu uma posição ofensiva seu cosmo expandiu-se de maneira abrupta. Como se fosse um novo cavaleiro.

- Não pense que me darei por vencido tão facilmente, estes ferimentos não significam absolutamente nada, ainda mais para alguém como eu, acostumado as mais difíceis provações...É hora de pagar por seus pecados do passado Kanon!!!

Seu cosmo resplandecia uma nuance invejável e por vezes o roxo mesclava-se com o dourado, mesmo depois de toda aquela dura batalha ele ainda conseguia tocar o ápice de suas limitações, quero dizer...Não existem limitações para homens como aqueles, a limitação significa fraqueza para os cavaleiros, pois todos podem se superar se lutarem por uma causa nobre, ou por algo que acreditem ferrenhamente, era isso que movia o grande mestre, um sentimento perfeitamente escondido por trás daquela casca que nem mesmo Kanon poderia transpassar. E então lhe sobrou apenas dois caminhos a seguir: Ou lutava com todas as suas forças ou seria derrotado no próximo ataque vide a gigantesca expansão cósmica de Shion.

Flash Back.

Athena.

Uma mortalha cobriu seu corpo.
O fantasma de um homem pálido partiu para seu destino.

Toda aquela conduta insana por ela...Sagrada armadura de Athena, fonte da vitória, esperança da terra, no fim das contas, ele tinha suas razões e não lhe importava o tamanho de seu fardo, ele aceitou pois era o único capaz, o único que tinha aquela valiosa informação e que morreu com ele a 13 anos.

Fim do Flash Back.

“ O que significa isso? ... Arrghhhh estou paralisado? ... Por que estou tendo estas lembranças...isso...isso deve ser esquecido...”

Lutar contra seu inimigo não seria problema, agora lutar contra si mesmo acabava se tornando a pior das missões; a técnica percorria seu corpo, se impregnando em suas células, não apenas isso, ela tentava dominar seu cérebro de qualquer maneira, para que assim ele revelasse todos os planos; o que significaria a falha de sua missão. Tinha que lutar, era preciso. Não contra Kanon, mas contra aquela terrível técnica que ele conhecia bem.

O seu cosmo – outrora imponente – agora perdia o brilho, ele caia ajoelhado com as mãos à cabeça enquanto gemia se contorcendo, mas, não mencionava até o momento, nenhuma palavra, nenhuma informação, nada...ele não falaria nada. Kanon perceberia que o satã imperial não conseguia dominar Shion, a determinação do grande mestre era muito maior que o controle mental causado pela técnica, seus movimentos aos poucos iam sendo recuperados enquanto ele usava toda sua força para livrar-se da paralisação. Por fim estava completamente “curado” e agora não pretendia mais perder tempo, tinha poucas horas para completar sua missão, ficar na casa de gêmeos por mais tempo colocaria em risco seus objetivos, tinha portanto, que dar um fim em Kanon, para que nunca mais pudesse voltar novamente.

De sua boca nenhuma palavra mais era pronunciada, no entanto, seu olhar parecia desvendar as lacunas de sua alma, era a pista que o grande mestre dava para Kanon, o ensinamento de alguém que lutou por muitos e muitos anos em prol da paz da terra, aquele último ensinamento deveria conduzir o cavaleiro de gêmeos ao triunfo, pois ele era um dos mais valorosos aliados que o santuário. O cosmo cresceu demasiadamente, a luz energética parecia engolir toda a casa de gêmeos, aquele era o último movimento de Shion de Áries naquela batalha, seu último ensinamento aos cavaleiros desta época, um teatro perfeito, agora...com dois atores. Finalmente um grito ecoava pela casa, um ataque era narrado enquanto uma chuva de luzes arroxeadas se formavam, todas elas eram lançadas na direção de Kanon, no entanto, aquela luz cegava os “observadores” o que se sabia era que muito poder estava sendo emanado, um ataque tão poderoso como aquele era capaz de destruir completamente a casa de gêmeos, e assim acontecia, enquanto as pilastras iam caindo uma luz iluminou os céus, toda a bela construção mitológica agora havia se transformado em ruínas. O grande mestre relaxava todo o poder expandindo fazendo-o desaparecer gradativamente, de pálpebras cerradas ele iniciava sua caminhada para o próximo desafio, contudo, deixava últimas palavras para aqueles que observaram todo aquele embate, nada nem ninguém era capaz de se esconder da percepção daquele homem.

- Melhor voltarem de onde vieram, digam a seus superiores que traremos a cabeça de Athena como combinado...