Athena Exclamation 2.0

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Saint Seiya forum


    Dante de Cérbero vs Geki de Urso

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    Mensagem por Convidad Dom Fev 28, 2010 2:10 am

    Esta é a estória de um homem. Um homem como outro qualquer, com suas virtudes e seus defeitos, suas falhas e seus acertos, suas perdas e suas glórias. Óbvio. O que é o ser humano senão um misto antagônico de bem e mal, de certo e errado, procurando sempre alcançar a perfeição? Este não é diferente dos demais; inclusive, pode-se dizer que é ainda mais complexo, mas isso é o que veremos um pouco mais adiante. Com a sua visão obstruída pela fosca – e finíssima, diga-se de passagem – membrana da dúvida, ainda assim caminhava. Fora convocado, juntamente com o seu amigo de tempos e atual irmão de armas e classe, Capella, para a missão de destruir os traidores do Santuário, os cavaleiros de Bronze, e trazer Saori Kido ao alcance benevolente do Grande Papa. Não pestanejaria em fazê-lo; não era, de fato, um homem de pensar duas vezes, mas o era ainda menos em assuntos de grande relevância ao Santuário que se dispôs a defender com a própria vida... Ao Santuário onde enterrou o seu coração e fez germinar vida no que um dia foi sombra. As lembranças do árduo treinamento na Sicília ainda latejavam em sua mente como se tivessem sido marcados em brasa... Tapas, beliscões, socos, pontapés. “Um mal necessário”. Assim pensava na época, mas agora, já homem feito, via que não há nada de necessário em ser cruel. Marco, o seu mestre, aquele que devia tê-lo ensinado toda a magnificência que há em ser um cavaleiro de Athena, só o trouxe truculência. E, lentamente, o garotinho, sempre sorridente, que um dia jurou aos pais se tornar o mais poderoso de todos para mudar o futuro, ia desaparecendo... Dando lugar ao seu "eu" mais temido. Aquele que amaldiçoou por dia e noite durante anos e anos.
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    As bolas de aço voavam pelo céu com maestria, refletindo sob elas mesmas o fulgor já quase apagado do sol da meia-tarde. Voavam, dançavam, pairavam no ar... Seguindo, de acordo com um ou outro rápido jogo de pulso, parábolas famintas rumo aos traidores do Santuário. O som de metal se chocando contra o solo... e a sua gargalhada ecoou prazerosa. A corrente se enroscou rapidamente pela perna do Cisne caído pouco mais à sua frente, temporariamente indefeso. Agora tinha dois dos traidores do Santuário em sua teia previamente tecida. O olhar se espreguiçou de um a outro, mordiscando o lábio inferior. Apertou as correntes pouco mais para junto do corpo, arrastando aqueles corpinhos raquíticos pelo chão de pedregulhos.
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    – E então, isso é tudo que vocês têm pra me mostrar? – Vociferou, adiantando-se dois ou três passos pouco mais à frente. Cerrou ainda mais firmes os punhos junto às correntes; parecia ter decidido o que faria com os garotinhos. – Hahaha, esses cavaleiros de Bronze não são de nada! – Sequer teve tempo de completar a frase sem se esbaforir. Os braços, numa súbita estocada para cima, lançaram os oponentes presos às correntes de suas bolas de aço no ar. Voaram, voaram e voaram, girando cada vez mais rápido acima do Cérbero.
    – Vão voltar pro lugar de onde nunca deveriam ter saído...
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    – ... pro Inferno! É pra lá que os traidores do Santuário vão, sabiam? Hahahaha!
    Todo o corpo se contraía devido à força do movimento executado. O corpo suava feito cachoeira, mas sequer sentia; há tanto que estava acostumado com as intempéries de guerreiro que era, que aqueles traidores de bronze, para ele, eram simples aperitivos. O cosmo se ergueu uma última vez. Não muito, somente o necessário para aquelas ratazanas traidoras... O cão que guarda as portas do Inferno brilhou às suas costas e, então, num rápido movimento de quadril, lançou a corrente rumo ao despenhadeiro à sua direita. O cosmo, borbulhante, ascendeu dos seus pés às têmporas, translúcido, errante, quase se apagando, tamanha era a excitação com que era invocado ao ver os traidores caindo devagarzinho, quase em câmera lenta, nas sombras sem fim da fenda por entre as rochas. Permitiu-se a uma última olhadela, de soslaio, para certificar-se de que havia eliminado aqueles “probleminhas” do Santuário de uma vez por todas, para então, num súbito giro de tronco, repousar o olhar sob a menina de cabelos violeta que o Papa tanto desejava.
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    – Ora... Não me olhe com tanta hostilidade, garotinha! Não vou lhe fazer mal algum. Só preciso que seja boazinha e venha comigo por bem, está certo?
    Não havia maldade em sua voz, longe disso. Mas, ainda assim, havia uma espécie de sadismo contido, de prazer obscuro. A mente nem mesmo chegou perto de captá-lo, de perceber que o que fazia, apesar de correto em sua visão obstruída pela maldade de Ares, era condenável diante daquilo que um dia julgou como justo. O sorriso que, mais cedo em sua vida, fora de simples e crua vontade de fazer o bem, de orgulhar aqueles que o puseram ao mundo, agora se transmutava no elemento químico oposto a este: era um sorriso plástico, um sorriso de falso veludo que se assemelhava cada vez mais àquele que não lhe escapava da mente por um segundo sequer... O irritante sotaque italianinho ainda ardia em sua mente. As palavras de Marco não o abandonariam jamais. Então por que se transformava cada vez mais naquele que tanto amaldiçoou? Por que se transformava naquele que tanto odiou, que tanto... amou?


    Última edição por [AE] Taurus|Aldebaran em Dom Fev 28, 2010 3:46 am, editado 2 vez(es)
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    Mensagem por Convidad Dom Fev 28, 2010 3:39 am

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    - Ei! Espere um pouco! Estes não são os únicos cavaleiros de Athena, hehehe... – eis que, quando tudo parecia perdido, o mesmo som metálico que fazia o ar vibrar e parecia condenar aquelas bravas crianças ao abismo de uma morte implacável agora ressoava de forma diferente, com uma nota nova que lhe dava ares de cântico da salvação; a corrente que prendia aqueles dois esguios corpos em suspensão encontrava na palma da mão do grande urso um obstáculo intransponível.
    Aliás, antes que isto passe em branco, é digno de nota o fato de ter feito questão de mencionar o título “cavaleiro de Athena” ao invés de “cavaleiro de bronze”. Geki o fazia por um motivo bastante óbvio, para falar a verdade: ainda que não conhecesse todas as motivações que o conduziam a isso – e era um quebra-cabeça que cedo ou tarde teria de completar -, tinha ele em seu íntimo a plena convicção de que a senhorita Saori Kido era realmente a reencarnação da deusa Athena.
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    - Não ouse se aproximar da senhorita Saori. Você ainda tem mais um adversário!
    Geki chegara ali no derradeiro instante, tendo conseguido segurar os dois companheiros que voavam rumo ao desfiladeiro com certa facilidade. Após colocar ambos - já bastante feridos - no chão com segurança, ele não pensou duas vezes e caminhou com largas e decididas passadas, colocando-se entre Athena e o temível cavaleiro de prata. A grave voz irrompeu com firmeza da garganta de um jovem robusto, um pouco mais alto que o adversário à frente. O recém chegado tinha feições bastante duras; era um rosto realmente másculo que, embora não se enquadrasse nos estereótipos comuns de beleza – principalmente oriental -, tinha seu certo charme rústico. Ao término daquele “aviso”, Geki abriu seus braços e, como um selvagem das montanhas, desferiu duas batidas secas sobre o peito estufado.
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    - Senhorita Saori, por favor... se afaste. – rangeu os dentes e fixou seu olhar na figura imponente do inimigo a ser batido. – Eu, Geki de Urso, irei acabar com você!
    Embora pudesse ser facilmente confundida com arrogância, o que o cavaleiro mostrava estampada em seu rosto era nada senão uma grande determinação que, por motivos que mais tarde descobriremos, enraizou-se em seu interior. Geki, então, entrelaçou os dedos e os estalou conjuntamente antes de adotar sua postura de combate. Fincou os pés no solo, fazendo uma base estável com a perna direita mais à frente e ambos os joelhos semi-flexionados. Os braços, levemente arqueados, estavam na altura do diafragma com as mãos abertas convergindo para o centro de seu corpo com os dedos levemente tensos. Por mais crítica que fosse a situação, ele se sentia animado por causa do combate vindouro. Alguma coisa que ele não sabia traduzir em palavras fervilhava dentro dele como um grande caldeirão de sentimento indomáveis.

    Era-lhe, pois, impossível esquecer a vergonhosa derrota para Seiya de Pegasus na Guerra Galáctica, malgrado a bruta força física que possuía com orgulho. A verdade é que este pensamento o assombrou com ardor durante os vários dias desde seu regresso ao gélido Canadá, palco de seu árduo treinamento que, no final das contas, acabou por se mostrar como um grande equívoco. Agora, então, ele tinha a oportunidade ideal para provar o seu valor, para provar que as noites em claro em sua cabana a matutar sobre os motivos de seu fracasso não foram em vão: era a oportunidade de Geki se firmar como um cavaleiro e redescobrir todos os motivos que o levaram a querer se sagrar um santo de Athena. O urso estava prestes a rugir!
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    Mensagem por Convidad Dom Fev 28, 2010 5:24 am

    A queda dos dois traidores atados à corrente parecia vir em câmera lenta. Um, dois, três segundos se passavam e ainda se encontravam ali, diante dos seus olhos espremidos, caindo e caindo. Unidos – ou melhor, entrelaçados, já que a corrente, no alto de sua parábola, enroscou os dois corpos de costas coladas –, os dois garotos caíam pesadamente, enquanto a fenda, exibindo para quem quisesse ver a sua bocarra sem dente algum, aguardava o fatídico desfecho. O Cérbero sorria prazerosamente, estampando de orelha a orelha um sorriso que quase gargalhava de tão intenso numa de suas duas facetas. O fim era inevitável. Pégaso inconsciente, Andrômeda e Cisne prestes a morrer. Não seria muito trabalhoso levar a jovenzinha de cabelos violeta ao Papa. Aproveitou-se da situação vantajosa para saborear o momento por pouco mais que meio segundo, alongando o olhar da dupla em queda à jovem Saori, e bastou este ínfimo deslize para que acontecesse o impossível. Foi o ressoar metálico das correntes em contato com as manoplas do Urso que retomou a sua atenção à frente. O objeto em queda - sim, um só, já que se encontravam num aglomerado de correntes e pernas, tamanho era o engalfinhamento de aço e suor - teve o seu trajeto interrompido e o recém-chegado, ao que parecia, era mais um cavaleiro de bronze. Eles não paravam de chegar... Como formigas.
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    – Mais um?! Minha nossa, que surpresa… – A voz soou melodiosa, quase engraçada. Repleta de uma sinceridade horrivelmente encenada. – Veio morrer também, traidor? Nada mais justo do que ser pelas mãos de um cavaleiro de prata, o que acha?
    Arqueou ligeiramente o tronco, realinhando a postura rija. O olhar foi, mais uma vez, de Andrômeda e Cisne ao mais novo adversário. Mordiscou por dentro o lábio inferior, ligeiramente intrigado sobre como aqueles malditos cavaleiro de bronze chegavam ali a todo instante. Primeiro Pégaso, depois Cisne e Andrômeda e agora aquele. Ora, eram como vaga-lumes atraídos pela luz... Semi-espalmou ambas as mãos à frente, junto ao abdome, enquanto um brilho, que oscilou rapidamente do fosco ao intenso azulado, revelou o surgimento de uma nova corrente. Cerrou os punhos ao seu redor, sentindo a gelidez metálica entrar em harmonia com o seu espírito ígneo implacável. Balançou a corrente vagarosamente para os lados, pendulando uma das esferas de aço da direita para a esquerda.
    – Mas, antes de tudo, me diga somente uma coisa... – Manejou a corrente mais para a esquerda, arrastando a enorme e pontiaguda bola de aço para mais perto de si.
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    – Eu simplesmente não entendo como são tão burros. – Quase não conteve uma risadinha com a própria sinceridade. Não que tivesse dito algo absurdo, só achou gozado tê-lo feito tão de súbito. – Digo... Você sabe, né? Vocês são cavaleiro de bronze. Não passou pelas suas cabeças que, com uma traição, o Papa mandaria cavaleiros de prata para matar vocês? Ou até mesmo os de ouro?
    Desdenhava as suas palavras com um veneno inconsciente, com o tal prazer obscuro que há tanto se acostumara a adotar desde a mudança repentina em sua vida. Não havia nada de justo no menosprezo, no desdém, na demonstração explícita de superioridade sem motivo; o que agora lhe era intrínseco, inescapável. Dedilhou as pequeninas partes de sua corrente pelos dedos calejados, mantendo o olhar, repleto de fixidez, sob o do Urso. Apesar do já dito, havia também um quê de curiosidade no olhar do Cérbero. Se indagava sobre o real intuito daqueles garotos. Tão jovens e já se rebelando contra Athena? Traindo aquilo que meses - ou até semanas - atrás juraram proteger? No fundo, bem no fundo mesmo – onde aquele garotinho que ainda brinca nas praças de Milão e jura à sua mãe proteger o mundo – vive, se recusava a acreditar que todos aqueles meninos fossem traidores. Só faltava se dar conta disso...
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    Mensagem por Convidad Dom Fev 28, 2010 3:02 pm

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    “Seiya, agüente firme!” – este pensamento cruzou sua cabeça de uma forma sincera. Por mais que não esquecesse aquele duelo, não nutria pelo companheiro nenhum sentimento negativo; pelo contrário, tais sentimentos ele tinha em relação a si mesmo, como uma amargura invencível, testemunhando pelo cavalo alado até mesmo certa simpatia por ter protagonizado uma façanha que ele jurava ser impossível.
    Geki sorriu de forma inicialmente melancólica, mas logo transformou esta expressão em um retrato de ânimo e fibra. Não poderia perder aquele combate! Por mais que Seiya estivesse inconsciente, não se permitiria perder na frente dele! Ele queria limpar a impressão deixada na Guerra Galáctica, contudo, isto não era apenas questão do orgulho ferido de um homem forte: aquela obstinação reta tinha muito mais a ver com o fato de nunca ter compreendido realmente o que significava ser um cavaleiro até então. Antes, ele era apenas um brutamonte com uma armadura, mas agora... agora ele era um santo de bronze.

    Os curiosos olhos ursídeos foram atraídos pelo fulgor metálico-azulado gerado entre as mãos do oponente. Fixou seu olhar na maça de ferro, acompanhando o movimento pendular desta pendendo sob a corrente. Aquela era a arma de combate do cavaleiro de prata: deveria achar um meio de neutralizá-la assim como acontecera com seus poderosos braços.
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    - Pare de falar bobagens! – flexionou mais os joelhos, baixando seu corpo e levando ambas as mãos ao solo. – Podemos até ser burros, mas não somos cegos. É Athena que está com a gente, e por ela... não tememos os cavaleiros de prata ou mesmo Santuário inteiro.
    Achava realmente estranho proferir aquelas palavras, pois elas pareciam muito mais um discurso ensaiado do que sua própria fala. Talvez estivesse lutando ainda por Saori, por alguma promessa de Mitsumasa Kido e por aqueles órfãos com quem dividira os preciosos e também difíceis dias de sua tenra infância. Por isso, por mais que acreditasse em Athena, ainda tinha esse sentimento confuso em seu coração. Acreditava nela, mas... por que o fazia? Era isso que impedia que aquelas palavras, apesar de sinceras, não parecessem completamente suas.

    Entretanto, precisava vencer para descobrir as respostas para tantas lacunas existentes em sua vida. A arrogância e o desdém do inimigo, longe de intimidá-lo, somente o estimulavam mais. Ora, ele mesmo havia sido presunçoso; ele mesmo havia menosprezado um adversário. O custo disso foi a queda, e esta foi uma lição valiosa. Agora era ele o azarão, e tinha plena consciência disso. Ademais, até preferia sê-lo; a adrenalina começou a correr freneticamente em suas veias, deixando-o ansioso pelo começo do combate.
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    - Você disse que eu ia morrer? Então vamos ver se você é tão bom assim! HAAAAAAA! - olhou uma última vez para a esfera de metal e esquadrinhou rapidamente todo o corpo do cavaleiro de prata. Não pensou duas vezes e deu uma arrancada abrupta, usando a avantajada força de seus quadríceps para impulsionar o pesado corpo até atingir uma velocidade considerável em uma crescente. O potente brado conferia-lhe a imagem de um urso selvagem correndo em direção à presa! A batalha havia começado.
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    Mensagem por Convidad Seg Mar 01, 2010 1:31 am

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    – Você viu o que fiz com seus amiguinhos... e ainda assim vai me atacar, rapazinho? – Um súbito jogo de pulso com a mão direita e a corrente se ergueu à altura do tórax, pendulando, agora, de modo mais intenso, mais sedento. As pernas foram se arrastando pelo solo pedregoso. A direita, servindo, talvez, de alavanca para o que viria em seguir, prostrou-se ligeiramente à frente, semi-flexionada, e a esquerda, por sua vez, cravada sob o solo pouco atrás, servindo de base.

    O olhar se fixou adiante, espremendo-se para enxergar perfeitamente através da breve cortina de fumaça e pedregulhos erguida com a partida de Geki. As imensas pernas do garoto se cravaram no solo ungido em sangue, catapultando o seu corpanzil em direção ao Cérbero. Este, no entanto, nada fez. Permaneceu ali, estático; o olhar semi-cerrado fixo sob a silhueta imensa do urso de bronze, que avançava, avançava e avançava... Já estava bem próximo. Pôde olhá-lo nos olhos bem de perto. Ou melhor, pôde olhar através deles, e tudo que viu foi obstinação. Uma obstinação proveniente da idéia inequívoca de que Athena estava ao seu lado. Pelo menos era o que ele dizia.

    Ridículo.

    Como o amor de Athena queimaria em prol daqueles que traíram sua própria identidade, os seus próprios ideais? Toda aquela ladainha já estava lhe enchendo o saco. Contraiu o bíceps direito com toda a força que tinha, estocando o braço pouco acima da altura do queixo, e ali o manteve. A corrente ergueu-se em conseqüência, chicoteando a bola de aço para cima. Observou os espinhos romperem os ares rente aos seus olhos, e um urro másculo irrompeu dos seus lábios. O rugido do Cérbero.
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    – Você quer vir, garoto? Que venha! – Seguindo o seu implacável rugido, o seu cosmos também crescia em grandes proporções. A partir de uma fina camada de energia, expandiu-se através de sua derme numa cor metálico-azulada, enquanto a faminta bola de aço girava e girava, cada vez mais rapidamente, seguindo o ascender abrupto de seu cosmos. – Vamos... VENHA!
    Um muro intransponível se ergueu em frente ao urso de bronze, moldado a partir da vontade inabalável de Dante e do seu cosmos aterrador, que fluía, agora, incontrolável ao seu redor. Os olhos se arregalaram, movidos pela excitação que invadia o seu ser naquele instante; fixos sob a enormidade que era o cavaleiro trajado num quase-ébano pouco mais à frente. Mais meia dúzia de passos e ele se chocaria contra a parede de aço erguida em cosmo. Passos que sequer precisaria dar: do brilho translúcido que nasceu da bola de aço pontiaguda, uma, duas, três réplicas brotaram, sedentas, se multiplicando em dezenas, centenas. As mil e uma bolas de Dante partiam em perfeitas linhas retilíneas contra o cavaleiro de Urso, partindo o ar em dois para concretizar o seu real intento: destruí-lo.
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    Mensagem por Convidad Seg Mar 01, 2010 3:47 am

    Naquele instante, Geki mais parecia uma besta indomável do que um homem, porém bastava um único olhar no fundo dos olhos daquele cavaleiro para notar que ele tinha ciência do que fazia e que não se arrependia de sua decisão. A corrida desenfreada rumo ao adversário podia até ser imprudente ou precipitada, mas não representava uma dominação por parte de seus instintos animalescos, senão uma força de vontade inextinguível que o movia quase compulsoriamente. Ele estava concentrado; sabia o que tinha que fazer e não hesitaria em fazê-lo, porque, por alguma razão, tinha ele a absoluta certeza de que aquela emoção que fazia seu peito vibrar ia muito além da euforia que normalmente sentia ao iniciar uma luta: era como uma pequena semente a germinar, marcando talvez o começo de uma vida nova. Sentiu, pois, o início de uma explosão querendo se manifestar em seu duro âmago.
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    “É muito rápido! Não consigo acompanhar direito, mas... preciso me manter focado. Merda! Minha única chance de conseguir acertar esse cretino depende disso. Preciso ver o seu ataque!” - voltou a olhar para a maça de ferro, que agora girava, e tentou seguir seus movimentos.
    O valente urso então respirou fundo pela última vez. Durante a corrida, reteve o ar em seus pulmões; o menor detalhe poderia fazer diferença naquele momento, até mesmo a sutil oscilação de seu corpo ao inspirar. A esfera metálica acoplada à corrente do cavaleiro de prata parecia formar uma grande muralha intransponível à sua frente em seu movimento circular. Era como se, mesmo sendo uma só, fossem várias bolas girando sem parar! O tempo necessário para aquela arma completar sua volta era ínfimo. Geki, no entanto, não confiava muito na possibilidade do inimigo adotar uma postura defensiva, e contava justamente com um ataque frontal. Esta fora sua intenção ao partir para cima repentinamente: sabia de sua condição de inferioridade naquele instante, e o que poderia fazer era induzir o outro a atacar, pois, tendo previsto este movimento, seria um pouco mais fácil para realizar um movimento evasivo e encaixar um contra-ataque em seguida. E se esse golpe entrasse... ah, ele acreditava que faria um grande estrago com suas pesadas patas! A julgar pela confiança excessiva e pelo menosprezo com o qual Dante lhe tratava, tudo levava a crer que ele estava correto em sua suposição. Contudo...
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    - Ahn?! Mas que porra é essa?! A bola na ponta da corrente, ela... está se multiplicando!
    ...rapidamente, o que ele acreditava ser um ataque em linha reta se transformou em simultâneos ataques devastadores. A maça do Cérbero parecia se dividir em três, assim como as cabeças do monstro mitológico de sua constelação; cada uma das três cabeças do cão de guarda do Inferno parecia dar origem a outras três e assim foi indo sucessivamente. Não que Geki tivesse conseguido visualizar este movimento; a única coisa que ele conseguiu ver foi aquela aura poderosa sendo emanada, que logo transformou aquela esfera em um borrão. Já era tarde quando notou que se aproximava de seu corpo uma saraivada feroz de ataques. Instintivamente, cruzou os avantajados braços, deixando o lado externo dos antebraços – revestidos pela indumentária – na frente do corpo para tentar bloquear os golpes; recolheu suas as pernas e colou o queixo no peito, deixando seu corpo como um único bloco sólido – mais forte e mais resistente, com menos área de contato para ser atingida, resguardando também seus órgãos vitais.
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    - AAAAAAAAAAAAH!
    Ainda assim, não foi suficiente para evitar que seu corpanzil fosse arremessado para trás com violência. Voou alguns metros antes de se chocar contra o chão, levantando uma grande cortina de poeira por causa de seu peso. Se não fosse pela defesa bem empregada e pela armadura que vestia, possivelmente nem mesmo a sua bem trabalhada musculatura resistiria àquela investida! Com o rosto colado ao solo, sentia seu corpo inteiro doer; a pele estava repleta de escoriações e o sangue escapava-lhe sem timidez por alguns talhos abertos pelos espinhos da arma mortífera de Dante. Levou a mão direita ao chão para se erguer, mas se sentia pesado como nunca. Será que duraria tão pouco assim a sua valentia? Não, a tenacidade de Geki não poderia ser só isso! Tenho certeza de que o urso ainda estava hibernando.


    Última edição por [AE] Leo|Aiolia em Sáb Mar 06, 2010 4:38 pm, editado 2 vez(es)
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    Mensagem por Convidad Seg Mar 01, 2010 10:55 am

    Do choque de forças, a explosão. E decorrente da explosão, o pó, que se ergueu na forma de uma densa cortina de fumaça, proveniente dos pedregulhos dizimados nos arredores. A energia cósmica fluía incontrolável pelo seu corpo, serpenteando na forma de diversos micro-feixes azulados; mais pareciam extensões do seu próprio ser, extensões de sua armadura – da corrente em suas mãos, em específico. Interrompeu o movimento com os braços ao captar o êxito do seu intuito ofensivo, e a bola de aço descansou de imediato na altura dos seus joelhos, pendulando de um lado para o outro por alguns segundos antes de repousar totalmente. O sorriso repleto de escárnio não lhe abandonou os lábios por um segundo sequer; ali se manteve, indestrutível, implacável em seu sadismo ao observar a poeira se dissipar e o corpo de Geki se mostrar imensamente escoriado. O olhar se estreitou adiante, observando uma trilha de sangue quase borbulhante se estendendo desde o local onde Geki estava antes de ser atingido, até uns dois ou três metros para trás, em meio a um tapete de pedra batida por onde o corpo do urso deslizou. No entanto, algo havia o incomodado. O sorriso no rosto foi lentamente desatando o seu nó, e o que minutos atrás fora arrogância, agora dava lugar a um misto de espanto e curiosidade.
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    – Ora… Você é um moleque um tanto quanto interessante. – Saltou do amontoado pedregoso onde se encontrava, pousando calmamente, embora com alguma truculência, próximo a Geki. As inúmeras micro-extensões da corrente do Cérbero vieram em seguida, chicoteando a bola de aço, por fim, aos seus pés. – Vejo que esses brações te serviram de alguma coisa, afinal... Não fosse a proteção deles, você agora estaria morto.
    – Não costumo errar, sabe? Mirei nas partes principais desse seu corpão desengonçado. Caso não tivesse interrompido o seu ataque, se juntaria aos seus amiguinhos... Hehehe! – O olhar foi lentamente abandonando o ar de surpresa adotado há pouco, voltando à habitual arrogância que lhe era tão costumeira. Apertou com ainda mais força as correntes juntou ao tórax, suspendendo a bola pontiaguda no ar. Ela balançava para os lados incessante, dançando uma música sem nome de ritmo algum. Acompanhando o deleite sombrio que era o massacre daqueles cavaleiros de bronze. – Vamos, se levante! Você chegou com tanta falação, que duvido muito que seja só isso o que tem pra me mostrar. Levanta, porra! Não gosto de chutar cachorro caído...
    Demonstrava, enfim, alguma honra, alguma característica positiva que não as de combate. Era, afinal de contas, um cavaleiro de Athena. E cavaleiros de Athena não lutam sem que haja plena igualdade de condições. Um homem contra o outro, sem trapaças, sem ardilosidades, em plena saúde e vigor físico. Ao menos, foi o que ouviu um certo dia. E, ainda que estivesse completamente diferente da pessoa daquele tal dia, esses ensinamentos, mesmo que não soubesse ao certo o porquê, não lhe abandonavam jamais. A sua mente pôs-se, então, a entrar num estado absorto que não acontecia havia muito tempo. Viajou, divagou, planou por memórias passadas, regredindo pouco mais de 10 anos. Lentamente, as memórias tomavam forma. Uma cachoeira que desembocava, um riacho que seguia o seu fluxo de calmaria... e, ao centro, três pessoas. Um casal e uma criancinha de cabelos castanhos e arrepiados.

    .

    .
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    – Dante! Dante, venha cá... A mamãe já não lhe falou pra não correr por cima dessas pedras?! Você vai escorregar! Vamos, pare! – A voz era doce, suave, repleta de uma amabilidade ímpar. A mulher de cabelos castanhos e olhar semelhante ao do garotinho se erguia pela metade sob a água, caminhando lentamente em direção ao pequeno filho.
    – Hahaha, olha, mamãe! Eu sei voar! Sou menor que vocês e já sei voar... – O garotinho erguia os braços acima da cabeça, simulando o tal vôo ilusório. Um sorriso de plena felicidade se estampava em seus finíssimos lábios infantis a cada palavra dita. – Um dia, eu vou ser o guerreiro mais forte que vocês já viram! Vou ser mais forte que... que... que aquele cachorrinho que está passando ali! – Girou o tronco para trás, sequer se dando conta da infantilidade que havia dito. Ora, crianças são assim. Qualquer besteirinha torna-se conto de fadas aos seus olhos encantados. O garoto agachou-se de súbito, pegando uma pedra pontiaguda que repousava aos seus pés, vítima da queda d’água. O bracinho jogou a pedra contra o pequeno cão moribundo; não sabia ao certo porquê, mas o fez. Talvez para demonstrar aos pais o quão forte era, mas, ainda que muitíssimo jovem, aquela cena jamais lhe escapou a mente: o cão olhou-o nos olhos fixamente, e tudo que viu foi sofrimento. Aqueles pequenos olhinhos apertados lacrimejavam, choravam, imploravam por um colo, por carinho...
    – DANTE, NÃO! – O irromper da voz de sua mãe pareceu encantamento aos seus ouvidos. Bastou ouvi-la para ter a plena certeza de que o que fizera era totalmente errado. Correu para os braços da mãe, chorando copiosamente. Quando ousou erguer a face, deu de cara com o olhar de reprovação do pai que tanto admirava. – Meu filho... Você ainda é muito pequeno, mas tem de saber que, se quer ser realmente um cavaleiro, terá de proteger não só aqueles fortes como você, como também aqueles que não têm condições de se proteger sozinhos... Como aquele cãozinho. O que você fez, meu pequeno Dante... não quero que se repita jamais, está bem? – Não precisou de truculência para fazê-lo aprender aquela lição. O garoto levou as pequenas mãozinhas aos olhos, enxugando as lágrimas de culpa que ali haviam. Levou o olhar do grande sorriso do pai ao cãozinho que havia arremessado o pedregulho. Para sua surpresa, ele não estava mais no local de antes; os seus espremidos olhinhos expressivos agora estavam pouco mais de dois palmos diante dos seus, enquanto se esfregava na sua perninha.
    – Olha, mamãe, ele gostou de mim! – As lágrimas voltaram a brotar dos seus olhinhos ligeiramente repuxados, de feições latinas. O cãozinho, mesmo após ter sido vítima de sua agressão, implorava por um colo, por carinho... o seu carinho! Tomou-o nos braços, recebendo uma carinhosa lambida nas maçãs do rosto. – Hahahaha, olha, olha! Ele gostou de mim! Hahahahahahaha... – A deliciosa gargalhada ecoou sozinha por alguns segundos, sob o sereno olhar dos seus pais. Havia o pequenino Dante, naquele dia, aprendido a maior de suas lições desde então. O que constatou-se com o que se deu em seguida. Palavras donas de uma maturidade impossível a um garotinho de pouco mais de 5 anos. – Sabe, mamãe? Um dia eu serei forte que nem o meu papai... E vou treinar muito pra fazer com que todo mundo seja feliz que nem a gente é! E também pra proteger todo mundo que precisa de mim... Eu... eu te prometo, mamãe!

    ...eu te prometo, mamãe!

    ...te prometo, mamãe!

    ...prometo, mamãe!

    ...prometo!

    ...mamãe!

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    Chacoalhou a cabeça instintivamente quando se deu conta de que voltara à tona. O odor embriagante de sangue a inundar as suas narinas que o havia feito despertar. Os olhos se marejaram depressa, numa fininha camada de lágrimas a cobrir o seu olhar cor da noite. Manteve-se impassível, contudo; ainda à espera de Geki, ainda, honrosamente, apesar do ar de sadismo que apresentava diante dos seus inimigos, esperando pela igualdade de condições que um dia foi instruído a respeitar.
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    Dante de Cérbero vs Geki de Urso Empty Re: Dante de Cérbero vs Geki de Urso

    Mensagem por Convidad Seg Mar 01, 2010 11:33 pm

    Com a mão direita ainda fazendo força contra o chão, Geki esmigalhou um pedregulho com certa raiva e deixou escapar um suspiro que mais parecia o urro de um animal ferido pelas garras implacáveis de uma armadilha. O suor escorria de suas têmporas até seu rosto, causando uma incômoda ardência ao entrar em contato com os arranhões que o solo arenoso causara em sua face. Não pôde deixar de perceber a aproximação de seu inimigo; ainda que seus olhos permanecessem fitando as diversas rachaduras desenhadas sobre o solo, aquele grandioso cosmo em movimento não mentia! Ele estava em completa desvantagem, atirado ao solo e prestes a ser subjugado. A imagem de famílias ursídeas abatidas com as patas fraturadas naquela insólita noite de janeiro não lhe saía da memória; sentiu-se como um deles no momento: completamente impotente diante da ferocidade do caçador.

    Então era só isso o que ele poderia fazer? Mesmo depois de ter retornado às Montanhas Rochosas, seu extenuante treinamento não havia lhe proporcionado outros frutos que não uma ilusão de crescimento? Tentou se erguer mais uma vez empregando a força bruta que lhe era tão característica, mas o braço trêmulo não mostrou a potência de outrora e vacilou, completamente incapaz de levantar não somente o seu peso corporal, mas acima de tudo a inefável carga que perdurava em seu coração e o remetia a um emaranhado de decepções e dúvidas.
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    - Woah! Arf, arf, arf...
    .
    .
    .
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    Lembrou-se bem do quanto morria de medo daqueles grandes ursos nos primeiros anos de seu treinamento; seus joelhos tremiam ao vê-los ao redor da montanha, e ele temia se aproximar deles até mesmo na companhia de seu experiente mestre. Passou a acreditar com a ignorância absolutória que só as crianças têm que os ursos eram seres maus. E como não pensar nisso? Ele via as carcaças de pequenos animais estendidas sobre poças rubras no chão diariamente e não conseguia deixar de pensar com tristeza nos filhotes que eles haveriam de ter gerado. Qual seria o futuro que lhes aguardava? Seriam igualmente devorados por serem mais fracos? Teve, naquele dia, a primeira noção da dinâmica predatória da vida.
    - Mestre, eu não entendo! Por que eles têm que morrer? Esses ursos são covardes! Eles deveriam brigar com alguém do tamanho deles! – disse revoltadíssimo para seu instrutor, cerrando os punhos com indignação.
    - Geki, não se esqueça que esses animaizinhos de quem você sente pena se alimentam de plantas. E elas são tão vivas quanto qualquer um de nós. Por que você não se revolta então contra todas as criaturas deste mundo? – falou com um tom quase paternal, tão diferente da voz rouca e ríspida com a qual costumava dar suas lições de maneira autoritária. – Hahahahaha! Geki, você é muito ingênuo ainda! Um dia essa sua bondade pode acabar custando sua cabeça. – riu com certo deboche, mas também com um pouco de carinho, e então afagou as volumosas madeixas púrpuras do rapazote.
    Ainda assim, teve um dia em que ele não quis mais sair da cabana. Aquelas palavras pareciam bobas vindas da boca de um garotinho de pouco mais que sete anos, mas elas também traduziam, a seu modo, uma das tristes constatações do mundo: os mais fracos eram constantemente esmagados pela vontade dos mais fortes. Um dia ele haveria de se dar conta de que isso não acontecia somente no reino animal, mas muito mais no mundo dos homens, e neste dia... neste dia nosso amigo Geki iria experimentar uma das grandes desilusões de sua vida. Mesmo neste dia, ele ainda seria bastante imaturo para finalmente entender as sábias palavras do Sr. Hughes sobre o que ele gostava de chamar de “o grande ciclo”. Mas voltemos àquele dia em que ele decidiu abandonar seu treinamento: ele não queria ver escancarada diante de seus pueris olhos a selvageria, não queria ter que encarar de frente a bestialidade das florestas, não queria perder o encanto pela natureza e suas criaturas. Uma criança não deveria ter que lidar com isso tão cedo!

    Geki arrumou seus poucos pertences em uma mochila bastante surrada com certa pressa e preparou-se para ir embora logo que o sol nascesse; havia inclusive deixado escrito um bilhete de despedida, pontuando cada frase com suas amargas lágrimas de incompreensão e medo. A lenha já havia terminado de queimar, escurecendo a morada completamente; aquela noite estava muito gélida, como era comum naquele período do ano, e então seu mestre, o Sr. Hughes, ordenou ao pequeno Geki que fosse lá para fora pegar mais lenha na clareira ao redor de onde moravam. Geki baixou a cabeça, resignado, e pegou o grande machado recostado do lado da lareira ainda morna com suas mãos já calejadas de tanto treinar.
    - Sim senhor, mestre. Já estou indo...
    Do lado de fora da cabana, levou sobre os ombros doloridos algumas pesadas toras de madeira até a base de um tronco, cujo restante da árvore já havia sido devidamente cortado e queimado. Com fortes socos, Geki quebrou as toras em vários pedaços menores para somente então colocá-las sobre aquela base de tronco; pegou o afiado machado, ergueu-o acima da cabeça e deixou os braços caírem, desferindo um corte descendente com precisão. Seguiu partindo a madeira em pedaços ainda menores e mais simétricos, “como uma boa lenha deve ser”, conforme as palavras do Sr. Hughes.
    “O quê?! Não, não me diga que...”
    Um rugido assustador eclodiu de repente, dando a impressão de estremecer até mesmo os galhos de algumas árvores mais novas. Geki não tinha percebido, mas um filhote havia se aproximado enquanto cortava a lenha; ele estava assustado com as machadadas e, pressentindo o perigo, sua mãe agora corria em seu socorro. A mamãe urso se ergueu – devia ter quase dois metros de altura, sem mentira! – e abriu seus braços. Ela estava pronta para defender o seu bebê com suas poderosas garras, e logo partiu para cima de Geki com o famigerado abraço da morte. O jovem japonês, no entanto, nada pôde fazer: havia congelado de pânico naquele momento e, quando já sentia o cálido bafo do animal tocando sua face, Sr. Hughes se interpôs aos dois com ambos os braços em guarda na altura da cabeça.

    O grande caçador havia conseguido segurar o impacto das patas do urso e rapidamente passou da defesa para o ataque: ambas as mãos foram certeiras em direção à artéria carótida e à veia jugular do animal. A pressão exercida pelas enormes mãos de seu tutor era extraordinária, conseguindo comprimir a traquéia com tanta violência que no mesmo instante o urso apagou, perdendo completamente o ar e consequëntemente a consciência. Não obstante, o Sr. Hughes só largou o pesado bichano que havia erguido pelo pescoço quando ouviu o inconfundível estalo de seus ossos. Estava morto.
    - Geki, você precisa entender uma coisa: somente os fortes sobrevivem! Esta é a lei maior da natureza. Você precisa adquirir uma força extraordinária capaz de suprimir os seus medos e capaz de assustar os inimigos. Você precisa ter a ferocidade dos ursos. Olhe para eles, aprenda com eles! Você quer se tornar um cavaleiro, Geki? Pois bem, antes disso você tem que conseguir estar no topo da cadeia. Seja o caçador, e não a caça. Cumpra o seu papel no Grande Ciclo!
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    .
    .
    .
    Não! Ele se recusava ficar à mercê de seu inimigo. Precisava triunfar a todo custo. Aquela lembrança lhe invocou grande pesar no peito, que agora se inflamava em uma raiva angustiante. Aquelas eram reminiscências de sua primeira ida ao Canadá, e de tudo que lá aprendera. Vamos nos ater a elas por enquanto, posto que nem mesmo Geki tinha total conhecimento sobre o que realmente descobrira em seu retorno àquele local.

    Com seus bem torneados tríceps, fez um movimento de extensão e levantou o peso do corpo até conseguir dobrar um dos joelhos e, por fim, esticar a outra perna até ficar ereto. Com o dorso da mão, limpou o filete de sangue que descia como um córrego pelo canto de seu lábio inferior um tanto inchado. Finalmente voltou a olhar para Dante, e então sorriu. Não era um sorriso arrogante, cínico ou debochado; tampouco era aquele semblante de alegria, mas era um sorriso mecânico e vazio de quem teve que descobrir como viver daquilo que mais odiava.
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    - Huhuhu... este foi um bom golpe, com certeza! Mas não bom o suficiente pra acabar com este urso aqui, hehe. O que eu quero saber é se você vai conseguir se levantar quando eu o acertar. - alongou o pescoço e soltou a tensão de seus ombros antes de adotar a mesma postura de batalha do começo da luta.


    Última edição por [AE] Leo|Aiolia em Ter Mar 02, 2010 10:28 pm, editado 1 vez(es)
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    Dante de Cérbero vs Geki de Urso Empty Re: Dante de Cérbero vs Geki de Urso

    Mensagem por Convidad Ter Mar 02, 2010 8:54 pm

    Permaneceu ali, quieto, rijo como uma pilastra de concreto. Os olhos repuxados, se estreitando para diminuir a dor da incisão de feixes solares sob as suas retinas, permaneceram fixos sob o inatingível – repousados sobre o corpanzil de Geki, claro, mas desfocados do seu real intuito. Sua mente disparava em pensamentos mil, indo e vindo incessante, se perdendo em meio a um turbilhão de lembranças que rasgavam o seu coração como navalhas. Desde as infindáveis tardes calorosas de Milão, com os seus pais – época em que nunca foi tão feliz –, até o dia em que os abandonou rumo aos árduos treinamentos na Sicília.

    Aquele, possivelmente, foi o dia mais triste de sua vida. Desde aquela fatídica tarde pouco ensolarada, ainda no navio cargueiro onde viajou clandestinamente, jurara não mais chorar. Não na frente de alguém. Por isso, quando retornava do seu campo de treinamento para repousar, após uma ou duas semanas, se enclausurava naquele quartinho sujo e apertado dos empregados, agarrando-se aos joelhos e despejando todas as lágrimas que insistiam em lhe apertar a garganta. Percebeu desce o início, por sorte, que Marco, seu mestre – ou torturador, como queiram chamar –, sempre ficava por detrás da porta, tentando ouvi-lo, procurando algum ato condenável para espancá-lo ainda mais. Chorava, então, ainda mais baixinho, prendendo o nó que lhe apertava o peito no meio da garganta; sofrendo cada dia mais e mais, enxugando as lágrimas com pontapés e bofetadas.

    Aos poucos, foi retornando às montanhas rochosas onde a sua presença corpórea sempre esteve. Pensou que Geki houvesse, de fato, morrido, tamanho foi o tempo que ficou estirado em meio à pedra batida, mas suas suspeitas se apagaram na inverdade. O urso ainda tinha forças para lutar.
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    “O moleque quase morreu e ainda tenta se levantar como se nada tivesse acontecido... Esse sorriso... ah, merda! Eu vou enfiar esse sorrisinho goela abaixo!”
    Ainda estava ligeiramente atordoado devido àquele furacão de memórias dolorosas que lhe navalharam a mente, mas enfiar aquele sorrisinho de merda pela garganta do moleque o curaria de qualquer depressão. A tênue linha azulada que envolvia o seu corpo se expandiu mais e mais, engolindo parte da alaranjada final de tarde montanhosa, transformando os seus arredores no sombrio metálico-azulado do seu cosmos. O cão de três cabeças, Cérbero, surgiu novamente às suas costas, desenhando-se tão nítido de estrela a estrela que o seu rosnar sombrio por pouco não tornou-se audível.

    Realinhou as mãozorras pelas correntes. A esquerda deslizou mais à frente, aproximadamente pela metade de sua extensão, e a direita, já que era destro, servia de base para um possível arremesso: mantinha-se praticamente nas micro-extensões finais da corrente, bem próxima à segunda bola de aço.
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    – Um bostinha como você achar que consegue me acertar chega a ser quase engraçado... – O tom odioso em sua voz não o deixava mentir: aquele garoto estava tirando-o do sério. Não é qualquer um que se levanta desse jeito após receber a saraivada de bolas de aço do Cérbero. Ainda mais um cavaleiro de bronze.

    A corrente pareceu sentir a fúria contida do seu dono: agitou-se, oscilando de um lado para o outro, tal qual uma serpente prestes a dar o bote. O seu cosmos fluía cada vez mais negro, cada vez mais envolto numa mortalha de sombras... Não que achasse que aquele sentimento era algo correto, justo, bondoso; não era hipócrita a esse ponto - talvez um pouco cego, mas não podemos julgá-lo por isso, como veremos em breve. Achava, ou melhor... foi instruído, em meio aos terrores da Sicília, a abandonar o que trouxera desde criança em seu coração. “Se realmente quer ser poderoso, seu bostinha, você tem de se comportar como homem!”. Era o que ouvia todos os dias, sem excessão. Jurou não se tornar o que Marco sempre quis. Jurou esquecer todos os ensinamentos grotescos que ele o passou, focando-se somente em sua progressão como cavaleiro - claro, havia prometido aos seus pais proteger todos aqueles que não têm força de fazê-lo por si só, esqueceram? -, mas de nada adiantava. Inconscientemente, óbvio, o garotinho de cabelos castanhos e arrepiados ia se perdendo em meio ao breu do odioso Marco.

    A arma letal se ergueu aos céus, projetada pela força braçal do grandioso Dante. As veias do seu bíceps e ombro direito saltaram, se dilatando através dos músculos do seu braço. O fulgor do giro da corrente de Cérbero varreu a poeira e o ar, contendo todo o poder do seu cosmos.
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    – Quero ver se você consegue falar tanto quando eu enfiar esses dentes tortos goela abaixo! – Liberou, então, a bola de aço pontiaguda contra Geki. Um ataque simples, concentrando todo o seu poder naquele único ponto à frente da corrente. Acreditava ter ferido o suficiente o corpo do urso para conseguir acertá-lo com aquele simples golpe direto. – Haaaaaa!
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    Dante de Cérbero vs Geki de Urso Empty Re: Dante de Cérbero vs Geki de Urso

    Mensagem por Convidad Ter Mar 02, 2010 11:48 pm

    Assim como ele havia feito, o adversário agora também reassumia sua postura de combate. O brônzeo santo, que já havia tentado observar o posicionamento corporal do inimigo em outra ocasião, prestava atenção mais do que nunca à base adotada por Dante. A incandescente aura azulada que transbordava do corpo deste produzia um fulgor incrível, algo que Geki nunca tinha visto antes e que, somada à pressão que produzia, causava nele um misto de espanto e admiração. Aquele era, sem dúvida, o cavaleiro mais forte que já havia encontrado até então, detentor não somente de força bruta, mas também de uma invejável técnica com sua arma, boa velocidade e aquilo que sempre lhe faltara: o domínio de seu próprio cosmo. Não pôde deixar de lembrar com certa decepção da vez em que zombara de Seiya quando este se pôs a falar sobre sua energia interior, tendo afirmado categoricamente que isto que no Santuário se convencionou chamar de “micro-universo em expansão” era a diferença que fazia com que, tendo um corpo tão delgado, pudesse sobrepujar a potência muscular do urso troglodita.
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    “Naquele dia, eu acho que perdi muito mais para mim mesmo do que para você. Seiya, você começou muito bem neste difícil caminho e eu tenho certeza de que você vai ser um grande cavaleiro! Mas para isso... você precisa sobreviver. E é por isso que eu não posso falhar aqui, até porque eu também sou um defensor de Athena.” – pensou enquanto observava o cavaleiro de prata que finalmente voltava a falar; as palavras proferidas carregavam um tom muito parecido com aquele que ele mesmo empregara ao se dirigir ao Pegasus, e esta constatação bastante óbvia mexeu com seus brios. “Naquela luta, você conseguiu inutilizar as minhas armas mais fortes, Seiya, e então contra-atacou sem que eu pudesse reagir. Foi o mesmo que o Sr. Hughes fez naquela noite com o urso que me atacou!” – e agora teve uma epifania, como se houvesse descoberto em algo simplório uma grande genialidade justamente pelo fato de não tê-lo percebido antes, por parecer ser algo tão complicado, embora soubesse que não era, pela demora sua para compreender. “Ele é muito rápido, mas eu já vi o seu ataque antes. Se eu conseguir neutralizar sua bola de aço antes que ela chegue até mim... eu posso ter sim uma chance!”
    O grandioso Cérberus ergueu sua destruidora maça e começou um movimento de rotação. Ora, Geki sabia o que viria depois disso! Um arremesso letal com uma rapidez incomensurável! O fato é que a pesada arma necessitava de velocidade antes de ser lançada em direção ao alvo, era daí que vinha a potência esmagadora de seu golpe. Veio, pois, a derradeira intimação de Dante; mesmo que não pudesse captar perfeitamente com os olhos a movimentação dele, Geki sentiu dentro de seu peito uma vibração estranha dizendo-lhe que havia chegado o instante crucial - era a sua intuição, o seu sexto sentido. Não titubeou e confiou nesta luz que, embora não conhecesse com propriedade, começava a resplandecer dentro de seu coração valente como o botão de uma rosa que se abre.
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    “É agora!” – disse para si mesmo, convencido de que poderia concretizar o seu intento. – HOOOOOOOOAH!
    Antes do braço direito do experiente combatente se esticar naquele lançamento, Geki o interceptou! Arrancou violentamente com a perna destra à frente; aproveitando-se do fato de estarem bastante perto, não demoraria tanto para encurtar a distância entre ambos. Entrou na guarda de Dante com o braço esquerdo já desferindo uma pancada bruta com a faca da mão visando acertar o epicôndilo lateral do úmero do braço direito dele – por sinal, justamente o ponto de onde a manopla de sua armadura não mais protege –, na parte onde os tendões se juntam ao osso. Esta investida seria possível porque, para lançar a esfera em movimento circular, o braço precisaria terminar de executar aquela curva até se estender, interrompendo a rotação. E foi precisamente naquele instante, antes de terminar esta curva, que Geki entrou com violência ímpar! Não obstante, a mão direita já foi ávida em direção ao pescoço para pressionar a carótida e a jugular com um peso esmagador, para assim também conseguir comprimir sua garganta.
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    Para finalizar, uma chave; tentaria, após o possível impacto, passar seu braço canhoto por cima do braço de Dante e travá-lo com seu antebraço por baixo do cotovelo dele, juntando seu bíceps ao tronco para limitar o ângulo de movimento do inimigo e então fazer uma alavanca no cotovelo do cavaleiro de prata ao pressioná-lo para cima.


    Screens meramente ilustrativas; considerar de acordo com o texto.
    Como tu manja dessas paradas, Dan, acho que tu vai entender.
    Se ficar meio confuso, me pergunta; se achar OP, avisa que eu dou uma editada. :*
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    Dante de Cérbero vs Geki de Urso Empty Re: Dante de Cérbero vs Geki de Urso

    Mensagem por Convidad Qui Mar 04, 2010 9:54 am

    O rugido da corrente metálica a zumbir pelos seus ouvidos ensurdeceu-o para o que realmente tinha importância: Geki aproveitava-se da atual proximidade física – que fora imposta, ironicamente, pelo próprio Dante –, arrancando em direção a ele e, com a lâmina de uma das mãos, tirando de seus punhos a sua arma, o chão sob seus pés. Urrou de forma bestial, levando a mão esquerda, outrora à frente para lhe proporcionar equilíbrio, à fonte de dor. Desconhecia o real motivo de tanta dor; era, afinal de contas, somente uma espécie de tapa no braço. Mas, ainda assim, não se conteve. Por cerca de um ou dois segundos, hesitou. E pagou caro por isso. A corrente que ia, desigualmente, se despejando aos seus pés, imensamente pesada, não foi empecilho para o inabalável urso, a nova montanha rochosa que se erguia em sua vida de inúmeras.

    Enquanto conseguiu manter o garoto distante, de um ângulo privilegiado, não havia tido problemas, mas, agora, à curta-distância, Geki mostrava que a chama do seu coração não fora apagada pela eterna gelidez canadense. Por pouco não pôde enxergar a imensa mão direita do rapaz e, ainda quando pôde, já foi tarde demais: um beijo frio lhe percorreu a espinha quando sentiu a sua carótida ser esmagada juntamente com a jugular. Por meio segundo, sentiu a vista escurecer. Quando a retomou de forma nítida, no entanto, não havia mais algo efetivo a se fazer para evitar o movimento ofensivo do urso. Tentou levar ambas as mãos, por instinto, aos musculosos pulsos de Geki, mas algo impediu a direita. O aperto em sua articulação, na junção do úmero com a dupla esqueletal do antebraço, foi tamanho que o urro, esmagado pela mãozorra do urso, se conteve num sibilo quase inaudível. A mão livre, contudo, apertava com toda a força que tinha, enquanto sentia a vista ser engolida pela mortalha de sombras. Os sentidos iam lentamente se perdendo no ébano de sua vista já fosca... Iam lentamente se misturando à agonia que jamais deixou de sentir desde que deixou o seu casebre em Milão.
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    – Gh... Ghhwa... – Havia tentado inspirar pela última vez. A sua face, já pálida, perdeu as emoções e a cor, e as pernas, outrora relutantes em se entregar, repousaram inertes na altura do abdome de Geki.
    O que se passa na mente dos homens quando a traiçoeira Morte toca a sua face e desfruta do último esbaforir morno daquele corpo de meia-alma?

    Dizem aqueles que chegaram muito perto dela, a tal Morte, que nesses momentos suas mentes foram varridas por vendavais de antigas emoções, de lembranças mil espalhadas pelos solos desiguais que se tornam as suas mentes, como um líquido imiscível que demora a se assentar, findando, pois, a borbulhar em suas idéias como as chamas daquilo que não quiseram ou não puderam fazer em vida - ora, todos os homens têm as suas vontades incompletas, os seus arrependimentos! Mas, incrivelmente, na mente daquele guerreiro não ocorreu nada disso. Permaneceu oca, estranhamente vazia, como se o seu corpo estivesse numa dimensão paralela e fria, que o castigava, no pós-vida, pelas suas escolhas errôneas em vida.

    De pouquinho em pouquinho - demorou, realmente, um bocado! -, os seus olhos foram abrindo, mas nada enxergou. Tateou pelo escuro e nada tocou. Caminhou, então, à frente; era a única coisa que poderia fazer naquele breu que lhe abocanhava a carne na incerteza do seu ser. Cerca de meia dúzia de passos e topou em algo. Tentou novamente dar uma passada, para ter a certeza de que havia algo inerte abaixo dos seus pés, e constatou que sim. Espalmou as mãos à frente do tórax, tentando materializar a corrente de aço na qual depositava toda a sua força, a sua honra, os seus intentos em vida. Nada. Estava sozinho... E com medo. “Ora, medo?!”, pensou para si mesmo, tentando se livrar do frio que lhe atravessou a espinha de súbito; mas sim, estava. Tênue é a linha que separa o ódio do amor, o medo da coragem, o bem do mal. Certo dia havia ouvido isso numa conversa do seu pai com um dos amigos, o barrigudinho de bigode engraçado a quem nunca havia dado atenção. Jamais concordou tanto.
    “Caralho...”
    – Hahaha! Está aí, seu bostinha? Você nunca muda. Continua o mesmo cagão de sempre! – A voz rouca, quase doentia, veio do chão; especificamente, do que estava abaixo dos seus pés. Era estranhamente familiar aos seus ouvidos... não, não! Familiar era pouco. Aquela voz imunda não podia ser de outra pessoa...
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    – Marco! O que... o que diabos?! – Não conseguiu esconder a surpresa. Tampouco a sua voz havia acabado de ecoar duas ou três vezes pelo breu – que, de tão intenso, era quase palpável –, as luzes se acenderam. Aos seus pés, Marco. O seu demônio particular, aquele que tornou a sua vida um mar de infelicidade por dias, meses, anos! O causador de seus pesadelos mais tortuosos.
    – BWAHAHAHAHAHA! Você devia ver a sua cara, sério. Parece até que viu um fantasma... – Ironizou, se debatendo para os lados; tentava, de alguma forma, se desvencilhar das correntes que lhe prendiam desde o pescoço, até os braços e pernas. Uma corrente espessa, rústica, metálico-azulada... Reconheceria-a mesmo após uma centena de anos: a corrente de Cérbero. – Olha, você bem sabe que eu não sou muito de pedir as coisas, mas... dá pra me tirar daqui? – Dante não moveu um músculo; ali estava, ali ficou. O olho direito do velho aos seus pés, ligeiramente estrábico, oscilou de um lado a outro, finalmente se fixando no eterno garotinho de cabelos arrepiados e constatando, então, que não receberia auxílio algum. – Ah, você não muda... Sinceramente, não sei qual é a graça que você vê em ser assim. Sempre que nos encontramos, nesses esbarrõezinhos de dois em dois anos, você fica aí, feito estátua... Otário que nem o pai.
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    Não ouse falar do meu pai. – A voz irrompeu dos seus lábios com uma cólera inumana. Para surpresa do velho atado ao solo, obviamente, que arregalou aqueles grandes olhões caídos, perceptivelmente surpreso.
    – Olha só! Foi só falar do papaizinho que a criança resolveu abrir o bico. – Um sorriso extremamente grosseiro brotou dos seus lábios mais grosseiros ainda quando rompeu as correntes com um simples cruzar de braços. Dobrou a coluna à frente, erguendo-se de súbito. Era um homem alto, bem alto; beirava os dois metros, aproximadamente. Encarou Dante no fundo daqueles olhos ardentes e, pela primeira vez, o demônio dos seus pesadelos voltou a tomar forma. – Por que só fica me olhando com essa cara? Você não vai conseguir se livrar de mim se não fizer algo, seu bosta. Vamos, me mate! Não é o que você quer? Você não precisa daquela correntezinha pra fazer isso... Não é este o motivo pelo qual você se lamenta até os dias de hoje?! De não ter me matado com as suas próprias mãos?! Pois bem, essa é a sua chance: ME MATA SE VOCÊ É HOMEM, SEU ANIMAL!!
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    – ... – Pensou ter balbuciado algo, mas a voz simplesmente arredou pé e não quis sair. Os olhos se jogaram ao solo, perdidos, desfocados.
    – Ah, como eu pensei... Você nunca foi dos mais corajosos. Pensa que eu não sei? Agora que se tornou cavaleiro, se esconde atrás dessa posturazinha presunçosa pra fingir que é o bonzão. Você não é... Continua aquele mesmo moleque que eu deixava surdo com uns tapões de três em três horas. – Aquela voz, embora repleta de um escârnio sem par – o que poderia dar margem a uma idéia infundada de simples cunho ofensivo –, vinha embargada, contudo, num tom de total inequivocidade. O demônio de olhos caídos interrompeu o seu caminhar, dobrando a coluna de modo a se pôr exatamente à altura dos olhos de Dante, mantendo cerca de um ou dois palmos de distância do seu rosto ao dele. Em uma das mãos, um cigarro que Dante sequer tinha o visto sacar. Tragou fortemente por dois ou três segundos, se deleitando naquele veneno. – Mas me diz uma coisa... Que merda é essa? Você vai deixar esse bostinha... digo, esse merda de bostinha, porque bostinha você já é... Bah, tanto faz: você vai deixar esse cara te vencer assim? Não foi o que eu te vi jurar um dia, enquanto chorava feito menininha trancado no quarto. Você prometeu que me mataria. Não vai conseguir nada se perder assim. Reage, menininha. – Cuspiu, por fim, a fumaça do cigarro em seu rosto, e tudo pareceu se transformar. Do infindável breu em sua mente, as cores voltaram a tomar forma e os sons rasgaram os seus tímpanos.
    Ainda estava ali, em meio às garras do urso; o ar lhe faltava, a visão se espremia num misto de fosco e nítido, a dor pungente percorria todos os seus nervos como se fosse parti-lo ao meio. Mas, ainda assim, tinha a inequívoca certeza de seu triunfo. O porquê de tal idéia nunca lhe foi tão claro: “Aconteça o que acontecer, tenho de me manter vivo. Pelos meus pais, por Marco, que ainda quero matar... Pela promessa que um dia fiz!”.

    O metálico-azulado que havia o abandonando no adorno de sua derme ressurgiu num regurgito súbito: se expandiu, engolindo a luz bruxuleante do final da tarde e queimando a pele de Geki como a pior das chamas. Decerto, aquele não era o poder de um cavaleiro de prata; por um segundo, alcançou o tão sonhado poder que somente os doze seletos homens de Athena podem: o sétimo sentido. O seu cosmo brilhou num tom de ouro, para então explodir.

    Urrou; dessa vez não de dor, mas sim para extravasar toda a agonia que sentira até então, para liberar toda a dor que lhe afligia aquele coração repleto de espinhos. Após se desvencilhar do aperto do urso, saltou cerca de dois ou três metros para trás, estalando o pescoço e retomando a corrente em mãos, que ressurgia após um abrupto brilho anil em suas palmas.
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    – Você vai morrer. – Reuniu todas as forças que tinha para despejar o maior dos bordões, mas a voz ainda fraca somente lhe permitiu este simples clichê, que refletia o único intento ardente através daqueles olhos em chamas.
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    Dante de Cérbero vs Geki de Urso Empty Re: Dante de Cérbero vs Geki de Urso

    Mensagem por Convidad Sáb Mar 06, 2010 5:44 pm

    Havia conseguido executar seu movimento exatamente da forma que pretendia, e isso o deixava animado; entretanto, longe de deixá-lo conformado com os resultados obtidos ou então excessivamente confiante diante de um sucesso, o êxito de seu ataque inspirava-lhe certa apreensão. Havia contado não somente com a sua habilidade – pois sabia que era inferior à do oponente –, mas também com uma boa dose de sorte. Não duvidava disso, e este era o motivo para aquela apreensão já referida. Ele não poderia deixar passar esta oportunidade, ele precisava se manter focado e encerrar aquele combate o quanto antes. Athena estava logo atrás, em pessoa, vendo seu guerreiro lutar! Por ela, não se permitiria cair nas armadilhas de um julgamento precipitado; não havia vencido ainda.

    O braço esquerdo tinha conseguido neutralizar o ataque vindouro e, não obstante, imobilizado seu oponente numa apertada chave aplicada com maestria; a mão direita, por sua vez, exercia uma pressão incomensurável sobre a garganta de Dante, tentando esmigalhá-la até o ar já escasso se acabar; não entraria oxigênio sem sairia gás carbônico. Aquele era um golpe que precisava não somente de uma força incrível, mas necessitava também de uma precisão cirúrgica para conseguir pressionar os pontos certos. Logo mais, apagar-se-ia a consciência do inimigo aos poucos como tantas vezes acontecera com os ursos nas gélidas montanhas da América do Norte. Os olhos aparentemente sonolentos de Dante deram-lhe a impressão de que seu poderoso enforcamento iria abater mais uma fera selvagem, e quando o corpo amolecido pareceu se entregar, Geki soltou a chave de braço. Tendo novamente a mão esquerda livre, juntou-a à mão direita para dar mais peso ao aperto mortal.
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    - Eu disse que queria ver o que você faria quando eu conseguisse acertar meu golpe. Vamos ver quem vai enfiar os dentes de quem goela abaixo!
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    Pesadíssimos corpos sendo erguidos. Olhos completamente rubros e esbugalhados a encará-lo com um pavor inefável. O urro de dor, já mudo, lutando para se arrastar garganta afora sem sucesso. O bafo quente sendo soprado com desespero em seu rosto inflexível. A espessa saliva escorrendo lentamente pelas bocarras junto com o sangue quente que gotejava feito uma triste cascata. O som seco e ritmado dos ossos se partindo como se fosse proveniente de um instrumento de percussão num ritual funesto. Todos os dias eram assim.

    Desde o dia em que desistira da tolice e da covardia infantis, desde o dia em que seu mestre salvou sua vida pela derradeira vez e o ensinou uma grande lição ainda fora de seu alcance... desde aquele dia, Geki parou de temer os ursos e se impôs a eles com uma grande bestialidade. Ele seria o caçador, e não a caça! Ele seria o forte, e não o fraco a ser subjugado! Ele estaria no topo da cadeia!
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    “Eu sou Geki, o caçador, e ninguém me mete medo!” – dizia para si mesmo em êxtase durante os anos que se passavam e à medida que as feras tombavam inertes sobre o solo maculado.
    Convencia-se da idéia de que deveria ter uma força implacável capaz de dizimar qualquer inimigo; acreditava que suas grandes mãos foram feitas para matar e se manter vivo, como se somente isto no mundo importasse. O mundo animal era assim: tudo girava em torno do princípio da preservação. Esta era a tal “lei maior da natureza”. Como seria de outro jeito? E... para que mais serviriam suas destruidoras patas senão para isso? Acabou se tornando uma pessoa completamente diferente daquele garotinho robusto e gentil à sua maneira, que chorava pelos filhotes e sentia pena e medo do futuro reservado aos fracos.
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    - O quê?! Você ainda tem forças para resistir ao meu estrangulamento?! Você deveria estar morrendo agora! Mas como...?!

    A chama que parecia apagava recebia uma lufada de ar novo e voltava a se inflamar, queimando até o infinito com uma magnitude imensurável! A aura de Cérbero reluzia como nunca, causando uma ardência semelhante àquela que experimentara ao tocar o ombro de Seiya naquele dia maldito. “Meu cosmo está queimando”, dizia ele naquela ocasião. Porém, naquele dia somente sua mão direito sentiu a dor; agora, era todo o seu corpo que parecia ser englobado pela chama azulada do cavaleiro de prata. Não somente os fortes braços que insistiam em erguer aquele oponente, mas todo o corpanzil do cavaleiro de bronze ardia de maneira estranha; estava ficando atônito diante daquela pressão energética assustadora!
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    “Não posso largar! Não posso! A senhorita Saori está ali atrás, e lá também estão Seiya e os outros! Eu preciso ser forte! Eu preciso ser o...” - sua face se contorceu em uma careta de de dor. – AAAAAAAAH! – gritava com força, tentando agüentar firme e não soltar o pescoço do oponente.
    Não conseguiu enxergar quando Dante se soltou; somente percebeu quando, empregando ainda mais força ao seu aperto, achou ter quebrado seu pescoço e percebeu que suas mãos estavam juntas não por terem esmagado aquilo que estava entre elas, mas justamente por não haver mais nada entre elas. O santo de prata havia se livrado e recuou sem que ele pudesse ver! Realmente, aquele guerreiro estava em um nível elevadíssimo, e doravante tudo seria mais perigoso para o grande urso. Geki respirou pesada e ruidosamente, olhando com incredulidade para Dante.

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